quarta-feira, 20 de maio de 2015

Canção para uma noite em Évora (1938) - a Carlos Querido


Canção para uma noite em Évora (1938) - a Carlos Querido

Meu avô José Almeida na noite
Esperava em vão a carruagem
Que nesse dia partira do Barreiro
Com o cofre para pagar aos homens. 
Em Évora apenas os sons da feira
Quebravam a angústia da espera
Dos carpinteiros da Companhia
Construtores dos telhados da linha.
Poucos anos antes no Valado de Frades
Um empregado de seu pai levava
Uma égua mansa pela arreata
Ao soldado chegado de Leiria.
Hoje é diferente. Já pai de filhos
Não acredita nas palavras do chefe
Nem no apontador deste grupo
Atónito na estação da CP em Évora.
Com o bocal da trompete na mão
Aborda um jovem e pede o cornetim
Ali entre a surpresa e a ousadia
No meio do pó do baile rasgado.
Tocou a «Moreninha» e o «Teodoro»
As músicas da moda, anos trinta
Ante o aplauso geral do baile
Logo havia abafado e figos secos.  
Cinquenta anos depois contava a sorrir
Há uma fotografia dele com a bisneta
No sol de Março da nossa terra
Sem saber da morte dos comboios.

José do Carmo Francisco   

(Fotografia da autoria de Larry Silver)  

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