terça-feira, 23 de abril de 2013

Balada da Serra dos Candeeiros



Balada da Serra dos Candeeiros

Grande parte da minha vida
Feita de paz e sem guerra
Foi numa casa construída
Com pedras daquela serra       (Mote)

Na Serra dos Candeeiros
Parava o vento do mar
Eram lentos os carreiros
Com os olhos a cantar

Traziam pedras gigantes
Para a mão dos britadores
Fazer em poucos instantes
As pedras dos construtores

Os pedreiros sujos de cal
A pegar no fio de prumo
Que traça numa vertical
Lugar do fogo e do fumo

Sem desenhos ou papéis
Nascia a planta dum lar
Quatro canas dois cordéis
São os limites dum lugar

Na Serra dos Candeeiros
O azeite era o mais puro
Os ventos tão verdadeiros
A cantar por sobre o muro

Vinha a água das cisternas
Sempre boa e sempre fria
Sem as técnicas modernas
A limpeza era uma enguia

Vinha o leite já fervido
Vinha o queijo saboroso
O dia era mais comprido
Tudo era mais vagaroso

A pedra que me defende
Do Verão e do Inverno
Não se paga nem se vende
É um valor forte e eterno

José do Carmo Francisco

(Fotografia de autor desconhecido)       

   

domingo, 14 de abril de 2013

A voz de Piedade Rego Costa



A voz de Piedade Rego Costa   (S. Miguel – Açores)

Minha voz passa por cima das ganhoas
Vai para além da Ponta da Madrugada
E desperta nos olhares destas pessoas
O desejo de se jogar um tudo ou nada
Lá onde a rua é o tabuleiro da cidade
Uma mesa de jogos e de fantasia
E se tudo o que eu canto é verdade
Vale a pena esperar um novo dia  

Minha voz passa por cima das ganhoas
Na viagem deste som até ao horizonte
E o eco vai depois perder-se nas lagoas
Depois da curva da estrada e do monte
Lá onde só chega o reflexo diferido
Da canção no mais escuro dum algar
Onde a terra é o silêncio adormecido
À espera da minha vontade de cantar

José do Carmo Francisco 

(Fotografia de Autor Desconhecido)   

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Balada da Rua Serpa Pinto



Balada da Rua Serpa Pinto

Mulheres na Serpa Pinto
Termómetros da cidade
Longas horas de amargura
Momentos de felicidade
Trazem a luz e o calor
À pedra das manhãs frias
Trazem frescura às tardes
Da rua dos nossos dias
Quando sacodem o sono
Farrapos de melancolia
Sabem que tudo na casa
Depende dessa energia
Dessa força transmitida
Dessa afirmação de ser
Todos os dias da vida
A razão de ser mulher
Na vida multiplicada
Na voz que sempre resiste
E acaba por vir cantar
Nos dias em que está triste
E transportam devoção
Na viagem mais profana
Fazer um tempo de festa
Mesmo em dia de semana
É a voz que ganha altura
Sobre as paredes das casas
Passam em bandos alegres
Só lhes falta terem asas
Mulheres que mudam a rua
Só porque vão a passar
Transformam toda a verdade
De quem espera num lugar
A grande revelação
Das dúvidas que elabora
No lado mais escondido
Que é o lado de fora
Vem a chuva vem o vento
Caem lágrimas em pingos
Esquecem os dias escuros
E só pensam nos domingos
Ficam as lojas vazias
Enche-se a rua de gente
É o Mundo que se altera
E passa a ser diferente
Passam mulheres só sombra
Logo atrás surgem meninas
No rio sem afluentes
Há barragens pequeninas
Por onde a água se fixa
À espera da combustão
Do peso forte da voz
Com o peso leve da mão
Num encontro imaginado
A viagem ao contrário
Entre o mais pequeno beco
E o Largo de Seminário

José do Carmo Francisco    

 (Fotografia de Autor Desconhecido)