quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Balada da colónia balnear do Montijo



Balada da colónia balnear do Montijo

Numa toalha estendida
Que era como um muro
Estava o mistério da vida
Onde o passado é futuro.
Na caixa de fato de banho
Fundo negro branca espuma
Sem dimensão ou tamanho
Tudo é coisa nenhuma.
Sessenta anos depois
Da colónia balnear
Ficamos aqui os dois
Para sorrir e cantar.   
Na Praia da Figueirinha
Ou será na Cachofarra
Da neblina da tardinha
Só fica uma algazarra.
Do passado é só memória
E do futuro é só sonho
O poema conta a história
Do mistério que proponho.
De tantos anos passados
 A vida não se revela
Anda por todos os lados
Entre sépia e amarela.
Perto do Cais da Cortiça
Com galeras de Pegões
Um sabor a injustiça
Sem motivos ou razões
Mesmo que tente e insista
Num futuro apenas meu
Este filho dum motorista
Nunca irá para um Liceu.
Seu destino é só cantar
Na camionete da carreira
Que a colónia balnear
É tempo de vida inteira.

José do Carmo Francisco

(Fotografia da Colecção Particular de JCF)

domingo, 17 de fevereiro de 2019

Poema para a Escola Primária do Montijo



Poema para a Escola Primária do Montijo

Pouco ou nada sei dos meninos da Escola do Montijo
Eu próprio estou na primeira fila mas não de certeza
A única certeza é a passagem do tempo em todos nós.
Havia só uma piada possível no Circo sobre o Arroios
Que tinha perdido no Luís Almeida Fidalgo por 8-0
Os palhaços jogavam com as palavras para dar o arroz.
Jogar com as palavras é o que todos nós afinal fazemos
Cada um no seu lugar, função ou competência particular
Umas vezes pela afirmação e outras pelo deixado silenciar.
Alguns morreram talvez mas os mortos empurram os vivos
E é deles que vem a força para olhar o espanto do Mundo
Que todos os dias se repete nas novas manhãs a chegar.
Lembro ou julgo lembrar que o Moura era mais pobre
E o Joãozinho era talvez o mais rico da primeira classe
Mas isso pouco importa hoje no momento da fotografia.
Dê as voltas que isto der eu continuo a pensar o mesmo
Pouco ou nada sei dos meninos da Escola do Montijo
Nem do menino que fui de bata branca há 60 anos.

José do Carmo Francisco

(Fotografia da colecção particular de JCF)

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Balada para 1978 em Santa Catarina



Balada para 1978 em Santa Catarina

Na casa onde eu nasci
E hoje é só uma ruína
Avô e Avó estão aqui
Ana Maria é menina.
Olho voltado para trás
Quem diria, quem diria
Com Ian, Lucas e Tomás
O mundo de Ana Maria.
Naquela rua tão discreta
Não se vê o Pelourinho
Os avós olham a neta
Com orgulho e carinho.
Se o frio já era mais rijo
Com Natal no calendário
Logo deixava o Montijo
Na viagem ao contrário.
Na noite da consoada
Sapatos na chaminé
Missa do galo atrasada
Caridade, esperança, fé.
Água da fonte, almude
Presépio roda a azenha
No cantar da juventude
Futuro que se desenha.

José do Carmo Francisco

(Fotografia da Colecção Particular de JCF)