sábado, 21 de março de 2020

Para os 128 anos da Filarmónica Catarinense



Para os 128 anos da Filarmónica Catarinense

(Poema autógrafo para Luís Almeida)

Primeiro eram as minhas lágrimas
No dia da Padroeira eu chorava
Porque não tinha visto o Peditório
E a Festa quase me passou ao lado.
Lágrimas da mãe do João Chicote
Ao entregar o seu querido menino
Ao meu avô e que o tratasse como
Se ele fosse mais um dos seus filhos.
Meu avô José Almeida era músico
Tocava trompete ou bombardino
Mas fazia caixões para os anjinhos
E usava lágrimas em vez de pregos.
Fosse na Granja Nova, no Carvalhal
Na Ramalhosa ou nas Alcobertas
Nós sem farda íamos fora também
E mesmo sem sair da nossa terra.
Primo Luís Freire fechou seu estojo
Não tocou mais e morreu em casa
Dois dias depois das fortes lágrimas
Da minha mãe no Domingo à tarde.
Só as trompas já eram um poema:
O Padre Castelão a falar ao Raposo
Vejo o Arnaldo e o David Funcheira
E todos os músicos do nosso passado.
Sem esquecer essas meninas todas
Melodias, contrapontos, harmonias
E capazes de salvar a Humanidade
Da sua morte já há muito anunciada.
Lembro meus tios Álvaro e Armindo
Meu tio-avô Joaquim com a tarola
As nossas lágrimas continuam a cair
Para eu trocar a Morte pela Vida.

José do Carmo Francisco

(Fotografia de Luís Eme)
    

domingo, 15 de março de 2020

Breve retrato de Ruslam Botiev



Breve retrato de Ruslam Botiev

No Domingo de manhã
No Chiado vi o artista
O seu nome era Ruslam
Passaporte de turista.

Pinta touros, cavaleiros
Luz da Mongólia natal
Gatos, pontes, mosteiros
São o Bom dia Portugal!

O Mundo visto ao contrário
Está na sede que se deseja
Ele num filme publicitário
Troca a noiva por cerveja.

Porca de Murça é passado
Nunca parou um segundo
Alfama é hoje o seu fado
E vai para todo o Mundo.

José do Carmo Francisco

(Quadro de Ruslam Botiev)

quarta-feira, 4 de março de 2020

Associação de Malfeitores



Associação de Malfeitores

Eu vi a morte do Jardim do Príncipe Real
Em vez da marcha fúnebre um saxofone
Ladrava ao céu como cão a chorar o dono.
Um turista reclamou ver o fim do jardim
Logo vereador alucinado decretou plano
Para acabar mesmo com o dito cujo jardim.
Foram sessenta e quatro árvores mortas
Alguns ainda diziam que estão doentes
Mas doentes são eles todos em delírio.
Desta associação já tenho eu uma conta:
Editaram livro meu com um veleiro na capa
Não eléctrico, autocarro, elevador, cacilheiro.
No Verão uma responsável veio proibir
Uma caixa de gelados nesta esplanada
Por razões estéticas. E eu espero o pior. 
 
José do Carmo Francisco

(Fotografia de Luís Eme)