sexta-feira, 13 de abril de 2018

Poema periférico para Francisco Távora



Poema periférico para Francisco Távora

O arco da Rua de São Bento já não está ali
Na Praça de Espanha ninguém repara
Há uma febre na pressa plural da cidade.
Nós ouvimos o que dizem as pedras
Na antropologia das gerações passadas
Que por aqui deixaram beijos e lágrimas.
Nós levamos no pálio a naveta do incenso
No Senhor dos Passos ou no Corpo de Deus
Entre os clarins os estandartes e as bandeiras.
Somos bisnetos de Montarroio de Mascarenhas
Nós sofremos de jornalite aguda, essa infecção
Para a qual não existe nem remédio ou vacina.
Somos nós afinal que contamos aos outros
As suas próprias raízes, histórias e peripécias
Mesmo que ninguém tenha reparado nisso.
Temos no nosso olhar um gabinete de estudos
Na voz temos uma grande sede de civilização
Numa cidade que há muito não pára de crescer.
Partimos sempre do pó para a posteridade
Temos um sonho impossível de concretizar
Parar uma hora o Sol sobre Lisboa ao meio-dia.
Só assim haveria  algum registo do brilho
Da luz forte das pedras e das ruas de Lisboa
Mas afinal o Sol não se demora na cidade.

José do Carmo Francisco   

(Fotografia de autor desconhecido)   

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