sexta-feira, 22 de junho de 2018

Poema periférico para Álvaro Pato



Poema periférico para Álvaro Pato

O poema passa quatro vezes por dia
À porta do lagar de azeite do teu avô
Entre o Bom Retiro e a Escola Técnica.
Tal como tu o poema não pode ouvir
As crianças a chorar na sala ao lado
Com as torturas das mães a confessar.
As cartilagens do ouvido estão quebradas
Golpes de tesoura repetidos e certeiros
Por um pide mau que sabia do seu ofício.
Eu não sou ninguém, fui delegado sindical
Vinte e quatro anos seguidos desde 1972
Por isso tenho hoje uma reforma pequena.
Mas dava um ano de reforma e vida a quem
Me dissesse onde os sapatos de Carlos Pato
Na arca guardados junto à cama da avó.
Nós continuamos a ser da mesma turma
Ninguém nos tira dessa fotografia anual  
A preto e branco como é afinal a nossa vida.

José do Carmo Francisco   

(Fotografia de autor desconhecido)

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