domingo, 18 de fevereiro de 2024

Novo poema nº 43 para Ana Isabel


Novo poema nº 43 para Ana Isabel

Um dia Jesus Correia (1924-2003) mostrou-me uma fotografia da equipa dos cinco violinos ao lado da criança prodígio Pierino Gamba de visita a Portugal em 1947.

Hoje vi no Youtube o vídeo com um menino russo com muito estilo a tocar como gente grande o Concerto nº 3 de Mozart para piano e orquestra de câmara.

Porque aqui é tudo uma questão de escala e de dimensão. No caso deste menino eu  tenho todas as dúvidas sobre a duração do efeito surpresa; a única coisa assegurada é o gozo pessoal e íntimo de cada concerto.     

 José do Carmo Francisco

 

domingo, 21 de janeiro de 2024

Novo poema nº 42 para Ana Isabel


Novo poema nº 42 para Ana Isabel

Eram frugais os cavaleiros de Nuno Álvares Pereira a caminho de Monchique; davam de beber aos cavalos na ribeira de São Teotónio, a seguir rezavam e só depois comiam pouco e devagar.

É por tudo isso que ainda hoje tanto a imagem e como o altar antigo permanecem e continuam no pequeno Santuário do Monte da Orada.

Porque nem tudo se perde na erosão do tempo que, sempre e todos os dias, trabalha para o lado do esquecimento.

José do Carmo Francisco

(Fotografia de autor desconhecido)

 

sábado, 23 de dezembro de 2023

Novo poema nº 41 para Ana Isabel


Novo poema nº 41 para Ana Isabel

Por causa da pandemia o meu livro No tempo de Jesus não havia fotografias não chegou a ser entregue à professora Helena na Escola do Telhal e foi pena pois até pedi à editora uma capa especial para o livro ser manuseado por crianças.

Em teoria e na minha expectativa, poderia ter sido um encontro feliz entre um pequeno livro de cinquenta crónicas, a professora e os colegas do meu neto Pedro.

Porque tudo na vida é um mistério e nos cruzamentos do trânsito do acaso foram outras as prioridades no mês de Março de 2020.

José do Carmo Francisco 

(Óleo de James Sand)


quarta-feira, 22 de novembro de 2023

Novo poema nº 40 para Ana Isabel


Novo poema nº 40 para Ana Isabel

Há sonhos que se perdem dentro das ruas escuras e no barulho do mar; talvez sejam mesmo pesadelos porque trazem no seu bojo uma angústia pesada.

A cidade tem a dimensão da narrativa, desenha-se como uma novela com as suas figuras, os seus interesses e as suas expectativas. 

Porque tudo se revela quando o vento empurra a neblina para dentro do mar e os telhados começam a brilhar com o sol que se demora e faz daquela superfície uma espécie de espelho.

José do Carmo Francisco      

(Fotografia de Luís Eme - Sesimbra) 


terça-feira, 31 de outubro de 2023

Novo poema nº 39 para Ana Isabel

 

Novo poema nº 39 para Ana Isabel

Ao ver o jurado do Prémio Literário a chá e torradas no melhor restaurante da cidade, o vereador da cultura prometeu-lhe logo assistência médica, dormida num bom hotel e até o pagamento do funeral.

Outra vereadora da cultura afirmou não fazer ideia de quem é Júlio César Machado, provando dirigir aquela área como podia estar nos Resíduos Sólidos, Espaços Verdes, Turismo ou Desporto e Acção Escolar.

Porque no sistema cultural perverso que é o nosso o que conta é encaixar os candidatos; não interessa onde nem como porque o importante é ficarem colocados.  

José do Carmo Francisco  

(Fotografia de Luís Eme) 

     

domingo, 15 de outubro de 2023

Novo poema nº 38 para Ana Isabel

 

Novo poema nº 38 para Ana Isabel

Caçar e cassar são duas palavras homófonas mas o seu sentido é muito diferente; a primeira usa-se para animais perseguidos, a segunda trata de procurações notariais.

Descubro em Negócio de pomba, novela de Vitorino Nemésio, as palavras «caçava a procuração» quando se devia ter escrito «cassava» no sentido de «anular ou fazer perder a eficácia».

Porque nem sempre o escritor ou o editor reparam nos chamados por toda a gente pequenos pormenores embora seja sempre neles que se localizam as grandes diferenças.  

José do Carmo Francisco   

(Fotografia de autor desconhecido)

 

segunda-feira, 18 de setembro de 2023

Novo poema nº 37 para Ana Isabel


Novo poema nº 37 para Ana Isabel

Há uma sombra entre a joeira e o corpo de quem a trabalha para fazer subir a palha e o feijão à procura do sopro de brisa capaz de separar o que o malho na eira não conseguiu.

Este mágico ritual que se repetiu de geração em geração, corre o risco de, em pouco tempo, não ter continuidade nem na família, nem na aldeia, nem no Mundo.

Porque são outros os caminhos e os processos, os tempos e as expectativas; tal como o trigo cujos silos são hoje ninhos de microempresas, o feijão chega em latas às prateleiras dos supermercados. 

José do Carmo Francisco

(Óleo de Antal Neogrady)


quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Novo poema nº 36 para Ana Isabel

 


Novo poema nº 36 para Ana Isabel

Um dia, na Associação Portuguesa de Escritores, Óscar Lopes ouviu uma jovem autora falar dum get together com escritores estrangeiros em visita a Portugal. Poderia e deveria ter dito encontro ou convívio. 

Hoje li numa lavandaria a palavra insólita DORR em vez de DOOR num dos modernaços cartazes bilingues com instruções aos clientes da loja. E mesmo que exista não faz sentido aqui.

Porque se trata de um outro nível; já não o uso indevido de uma expressão inglesa mas o erro crasso de palavra que presumo não existir e não tem razão para integrar o bilingue cartaz.

 José do Carmo Francisco

 (Fotografia de Luís Eme)


quinta-feira, 20 de julho de 2023

Paolo Rossi com a camisola 20 azul


Paolo Rossi com a camisola 20 azul

 Falo de factos – não de imagens. /As imagens falam por si.

Em Pontevedra não podia descansar/nos intervalos da neblina e dos boatos./Por tudo e por nada entrevistas, obstáculos,/intrigas por causa de um jogo feio em Braga./Depois o medo perante a Polónia em Vigo/e um nome que toda a gente repetia – Boniek.

N´Kono e Quiroga sem golos meus/Mlynarczyk também, nos três empates de Vigo./Veio uma espécie de chuva triste atrás de mim/no caminho até Barcelona, do outro lado.

Tardelli e Cabrini marcaram por nós/Com Gentile a não dar espaços a Maradona./Bearzot falava comigo num cenário de flores/queria esquecer tantos jogos sem marcar/e havia o silêncio decretado pelo capitão Zoff/mas dentro de mim um receio crescia, grande:/não ser capaz de responder com factos ao medo.

E só contra o Brasil me libertei das sombras/para iluminar três vezes o azul da camisola. /No Estádio do Barcelona de novo a Polónia/e dois golos meus, um em cada parte do jogo./Finalmente no Santiago Barnabéu a final/com a Alemanha Ocidental, como se dizia então/Os golos todos na segunda parte do jogo/a partir do mágico minuto cinquenta e sete.

Foi nos seis golos que desfiz a chuva de Vigo/os quase dois anos sem jogos de competição,/a falta de confiança e a cortina de silêncio/à volta dos cinco jogo sem marcar/incluindo aqui também o jogo de Braga.

Falo de factos – não de imagens. /As imagens falam por si.  

 José do Carmo Francisco

 (Fotografia de autor desconhecido)


sexta-feira, 7 de julho de 2023

Novo poema nº 35 para Ana Isabel


Novo poema nº 35 para Ana Isabel

«Inês Maria, Bruno Manuel, Mafalda Sofia, Luís Victor» - só as mães chamam assim as crianças nos toldos da praia quando os maridos vão dar uma volta e se demoram na esplanada.

Há uma homologia quase total entre o olhar de uma crónica de Alexandre O´Neill e a fala de Clotilde Armenta num livro de Gabriel García Márquez - «Nesse dia percebi como nós, mulheres, estamos sozinhas neste mundo.»

Porque tudo isto é verdade e na grande solidão exterior do Mundo as mulheres carregam o peso da sua segunda solidão; uma certa solidão interior. 

 José do Carmo Francisco

(Óleo de Elioth Gruner)