Boa tarde
O ladrão não respondeu ao desejo de boa tarde
Do morador que com ele se cruzou na escada.
Colou-se ainda mais à parede, desceu depressa
E sumiu-se veloz no fim da Travessa sem gente.
Boa tarde era
para ele uma mochila tão repleta
De relógios, ouro, prata, jóias e casquinhas
Sem esquecer o meu computador portátil
Com poemas, crónicas e imagens desde 2002.
A pressa do ladrão era a carrinha à espera
Uns chegam de Espanha e os outros de Itália.
Das obras do telhado o compatriota avisou
E no domingo à tarde se rasgou o aro da porta.
Quarenta e cinco anos de vida na mochila
Valor sentimental escapa às contas do Banco.
Este postal da Polícia até já está impresso
E avisa não se poder avançar no assunto.
No domingo à tarde a vida fica suspensa
Gavetas pelo chão e móveis arrombados.
Alguém que não conheço violou o silêncio
Do espaço onde meus filhos gatinharam.
O ladrão não respondeu ao desejo de boa tarde
Tinha pressa em chegar a Madrid ou a Milão
Para derreter o ouro roubado na minha casa
Em barra com número de série e contraste legal.
José do Carmo
Francisco
(O óleo é de Michele d' Avenia)
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