Balada da Praça da Fruta
(a Carlos Querido)
João Cristo, sua cocheira
Onde o meu avô sabia
Que a burra trabalhadeira
Era a dez tostões por dia
Ficava ela a descansar
Nas cocheiras da cidade
Desconfiada do lugar
E moscas em quantidade
Minha tia Francelina
Nascida no Zambujal
Vinha vender obra fina
Os bichos do seu quintal
Numa carroça pequena
É que o seu mundo cabia
Sempre calma e serena
Dava-me um beijo e sorria
Exame era uma guerra
Bebemos uma gasosa
O grupo da minha terra
Não levou uma raposa
Nos armazéns do Chiado
Pronto-a-vestir é um fato
Nunca tinha reparado
Neste novo artesanato
Meu exame da terceira
Foi feito sem companhia
Em Abril, segunda-feira
Já não me lembro o dia
Chamado para a inspecção
Sou dado como capaz
Dentro duma contradição
Não sou guerra mas paz
Minha prima Deolinda
Professora de crianças
Na doçura que não finda
Dava-me muitas esperanças
Suas torradas matinais
A caminho do regimento
Davam-me forças especiais
Para marcha e movimento
Fosse das suas orações
Ou fosse da entrevista
Eu passei sem ralações
E fiquei em contabilista
Com três filhos crescidos
E acrescentado um neto
Compro beijinhos pedidos
E cavacas no Gato Preto
Praça da Fruta eterna
Onde o mundo nunca pára
És tão antiga e moderna
Porque és uma praça rara
Povoada por mil paixões
Todos nós mesmo distantes
Trouxemos nos corações
A força dos teus
instantes
E mesmo na chuva londrina
Tomas, meu neto à escuta
Recorda Santa Catarina
E lembra a Praça da Fruta
José do Carmo Francisco
(Fotografia de Luís Milheiro)
Sem comentários:
Enviar um comentário